Diante de mais um adiamento na divulgação do Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo), movimentos populares solicitaram intervenção do governo federal para destravar a proposta. O pedido de ajuda foi apresentado em forma de carta direcionada ao presidente Lula e lida nesta sexta-feira (13) no 1º Encontro Internacional de Territórios e Saberes (Eits), realizado em Paraty (RJ).
“Compartilhamos da intenção do governo federal em ‘liderar pelo exemplo’ a agenda internacional (…) Mas como o Brasil, campeão mundial do consumo de agrotóxicos, pretende exercer essa liderança se é incapaz de instituir um programa tecnicamente embasado que dará contribuição decisiva para o alcance desses objetivos, sem que isso comprometa a eficiência produtiva da agricultura brasileira?”, questiona um trecho do documento.
O Planapo seria apresentado nesta sexta-feira (13), conforme acordado com a Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Cnapo). No entanto, representantes dos movimentos populares apontam para a resistência do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) em aprovar o Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pronara) e denunciam a influência de representantes do agronegócio nessa decisão.
“Em um país que arde em chamas, em grande medida pela ação criminosa de agentes do agro, esse novo veto ao Pronara expressa a força desmedida que grupos de interesse privados instalados no Mapa exercem sobre o executivo federal”, alerta um trecho da carta.
De fato, o agronegócio marca presença nas tratativas que envolvem o governo federal. De outubro de 2022 a agosto de 2024, o governo teve pelo menos 752 reuniões com defensores dos agrotóxicos, segundo o relatório Regulamentação de agrotóxicos: o trânsito de lobistas no Executivo federal em meio à definição de novas regras, publicado em agosto de 2024 pela ONG Fiquem Sabendo. A autoridade que mais se reuniu com lobistas ou empresários do agro foi o secretário Carlos Goulart, da Secretaria de Defesa Agropecuária (SDA), do Mapa.
As dez fabricantes de agrotóxicos mais assíduas em compromissos com o governo federal são Bayer, Basf, Syngenta, Corteva, Sumitomo, Dow Brasil, Rhodia, Ourofino, Adama e Iharabras, que, juntas, somam ao menos 205 reuniões.
“A carta que divulgamos hoje deixa claro que somente uma mediação direta da presidência da República será capaz resolver o impasse gerado pelo Ministério da Agricultura”, avalia Paulo Petersen, representante da Articulação Nacional de Agroecologia na Cnapo. Ele esteve em Paraty para a leitura da carta. “As tentativas de negociação entre ministérios não resultaram, nem mesmo com o Mapa em posição de isolamento em meio aos 14 ministérios que compõem a Câmara Interministerial de Agroecologia e Produção Orgânica”, diz.
A princípio, o Planapo seria lançado junto ao Plano Safra, no começo do mês de julho, mas foi adiado por entraves em relação ao Pronara. Depois disso, foi adiado mais duas vezes. O programa foi elaborado em 2013 para orientar e organizar as iniciativas do governo federal para restringir o uso de agrotóxicos no país.
Em resposta ao Brasil de Fato, o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), responsável pelo Planapo, informou que não havia firmado uma data oficial para a divulgação do plano. “Embora não tenha ocorrido anúncio oficial sobre o lançamento do Planapo, havia expectativa da sociedade civil para tal, porém, não só não foi possível concluir a tramitação do processo, como a presença do ministro Paulo Teixeira seria inviabilizada pela agenda dos ministérios da Agricultura do G20, em Cuiabá (MT)”, informa a nota.
Peterson ressalta que havia um acordo entre o governo e a sociedade civil para a divulgação da proposta. “Mas deixamos claro que não aceitaríamos o Planapo sem o compromisso de instituir o Pronara. Como o compromisso não veio, não foi lançado o Planapo”, diz.
A reportagem solicitou resposta ao Ministério da Agricultura e Pecuária, que não se manifestou até o fechamento deste texto. Caso haja resposta, a reportagem será atualizada.
Edição: Thalita Pires