O artigo 153 da Constituição Federal, promulgada em 1988, determina que compete à União instituir impostos sobre grandes fortunas mediante lei complementar. Após quase 35 anos, a medida nunca saiu do papel. O que houve foi justamente o contrário do previsto na Carta Magna: uma redução nas taxações para a parcela da população brasileira que concentra altos patamares de riqueza.
Com o avanço da reforma tributária no Congresso Nacional, a pauta do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) ganha novamente centralidade no debate público do país. A taxação é identificada por setores populares da sociedade brasileira como um importante instrumento para reduzir a desigualdade social no país.
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De acordo com o presidente do Instituto Justiça Fiscal, Dão Real Pereira dos Santos, o sistema tributário brasileiro é regressivo, os principais impostos são cobrados em cima do consumo e não sobre patrimônio e renda, contribuindo não para corrigir, mas aprofundar a injustiça social no Brasil. O auditor fiscal explica que a criação do IGF seria temporária.
“O Imposto sobre Grandes Fortunas não deve existir para sempre, para ser eterno. Temos que pensar como um imposto temporário para reduzir o extremo de desigualdades. Ele retira parcelas de recursos ou de rendas de pessoas com grande patrimônio para distribuir na forma de políticas públicas, para distribuir para setores mais vulneráveis. Quando a desigualdade diminui, temos um sistema eficiente, capaz de não estimular a concentração [de renda], por exemplo. Temos um sistema tributário hoje no Brasil que é regressivo, ou seja, provoca desigualdades, ele beneficia a acumulação de riquezas”, afirma.
Quem será tributado?
A pergunta “quem será tributado?” fica na ponta da língua de boa parte da população brasileira. Atualmente, tramitam no Congresso Nacional diferentes propostas para a taxação de grandes fortunas. Uma das mais antigas é um projeto de lei de 2008, de autoria da então deputada federal Luciana Genro (PSOL-RS), que determina a cobrança para pessoas físicas com fortuna superior a R$ 2 milhões. Há também propostas como a do ex-deputado Leo Moraes (Pode-RO), que considera grandes fortunas patrimônios acima de R$ 20 milhões.
Os movimentos de taxação não têm partido apenas da esfera política, onde seguem engavetados, mas também da sociedade civil. A campanha “Tributar os Super Ricos”, composta por mais de 70 organizações da sociedade civil, propõe que pessoas com patrimônio superior a R$ 10 milhões paguem o IGF sobre a parte que exceder esse valor. Por exemplo, se alguém tiver R$ 12 milhões de patrimônio, pagará imposto sobre R$ 2 milhões.
De acordo com os dados levantados pela campanha, 59 mil pessoas possuem patrimônio superior a R$ 10 milhões. Isso representa 0,028% da população. Com esse imposto, segundo o movimento, será possível arrecadar mais de R$ 40 bilhões por ano.
A ideia da proposta é que no período de cinco anos após a instituição do IGF, as alíquotas do tributo, de 0,5%, 1% e 1,5%, sejam elevadas para 1%, 2% e 3%, respectivamente, sobre as faixas de patrimônio: acima de R$ 10 milhões até R$ 40 milhões; acima de R$ 40 milhões, até R$ 80 milhões; e acima de R$ 80 milhões.
“Considerando as alíquotas progressivas, de 0,5%, 1% e 1,5% poderia gerar a arrecadação de R$ 40 bilhões, valor que faz muita falta para saúde e educação. Temos um tributo constitucional não cobrado e temos a fome, que é inconstitucional porque o artigo 6° da Constituição diz que um dos direitos sociais é o direito à alimentação. É uma questão de escolha política, mas friso, são escolhas que dependem da correlação de forças na sociedade brasileira”, ressalta Dão que também integra a campanha.
Fuga de capitais?
Os crítico ao IGF citam que a medida não geraria uma arrecadação significativa para mudanças estruturais no país e provocaria a fuga de capital e investimentos do Brasil. Para o presidente do IJF, o argumento é falacioso e frágil.
“A fuga de capitais não se dá sobre o imposto de patrimônio, mas sobre o Imposto de Renda e nós não deixamos de cobrar o Imposto de Renda porque as grandes empresas conseguem transferir seus lucros para paraísos fiscais, nós continuamos tributando a renda. Portanto esse argumento de que não devemos cobrar o IGF porque as fortunas sairão do Brasil, é como dizer uma coisa é sair renda, a pessoa ao invés de deixar um dinheiro depositado num banco no Brasil, deposita nas Ilhas Cayman por exemplo, outra coisa é o patrimônio, muitas vezes, mesmo depositando o dinheiro nas Ilhas Cayman, o dinheiro compra patrimônio no Brasil, compra fabrica, ações, fazendas, imóveis, estamos falando de riquezas e riqueza não é apenas dinheiro que a pessoa pode transferir de um banco para outro”, explica o auditor fiscal.
Fonte: BdF Rio de Janeiro
Edição: Mariana Pitasse