Em um relatório enviado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), nove entidades – entre elas a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) – afirmam que 12 mil pessoas do povo Pataxó estão vivendo sob uma “guerra de baixa intensidade” no sul da Bahia.
O documento afirma que os indígenas estão sob ataque constante de fazendeiros, paramilitares e policiais, em um contexto de campanha difamatória anti-indígena por veículos de imprensa como Band e Jovem Pan. Segundo as entidades, os esforços do governo federal “para conter as investidas dos fazendeiros e milicianos” se mostraram ineficazes.
“Os ataques das milícias”, afirmam as organizações, incluem “impedimentos no direito de ir e vir, lançamento de bombas de gás lacrimogêneo, tiros de metralhadoras e pistolas automáticas contra imóveis, realização de despejos sem ordem judicial e outros”.
Apontam, ainda, que as ações são promovidas “de forma orquestrada”, com “uma cadeia de comando que conta com apoiadores, vigilantes, executores, mandantes e possíveis financiadores”. Os principais alvos são os Pataxó das Terras Indígenas (TI) Comexatibá e Barra Velha.
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Considerando o conflito de “enorme magnitude”, as entidades demandam um “comprometimento de todas as esferas de governo, tanto federal quanto estadual” e afirmam que até o momento “não houve esse pacto consensual das esferas de poder em prol dos povos indígenas”.
“Íntima relação de policiais com fazendeiros”
Na última terça (28), a Secretaria de Segurança Pública da Bahia aprovou um “Plano de Atuação Integrada de Enfrentamento à Violência contra Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais”, com vigência até 2026. Os municípios identificados como “sensíveis” para a atuação policial são Eunápolis, Itabela, Itamaraju, Porto Seguro, Prado e Santa Cruz Cabrália.
No entanto, o relatório ao CIDH destaca, justamente, que a “íntima relação de policiais da Bahia com os fazendeiros têm tornado as instituições de segurança inacessíveis e ameaçadoras para os indígenas”. Assinado também pela Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME), o documento pede o envio da Força Nacional de Segurança Pública à região.
O Ministério dos Povos Indígenas prorrogou por 45 dias as atividades de um gabinete de crise que foi criado em 20 de janeiro para acompanhar a situação dos Pataxó no extremo sul baiano. A pasta anunciou que planeja enviar uma comitiva à Bahia, com a presença da ministra Sonia Guajajara.
As medidas do gabinete de crise, na avaliação das nove entidades, “não tiveram grandes efeitos como esperado”. Como exemplo, citam a falta de retorno positivo diante de pedidos de diálogo com o governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues (PT).
Retaliação
Diante da demora na demarcação de seus territórios, o povo Pataxó do extremo sul da Bahia se organiza para retomar e autodemarcar as suas terras desde o início dos anos 2000. Esse processo se intensificou no segundo semestre de 2022, quando num período de três meses, cinco áreas foram retomadas. Desde então, episódios de violência contra os indígenas se acentuaram.
Em 17 de janeiro deste ano, Samuel Braz e Inauí Brito, dois jovens da TI Barra Velha, foram assassinados às margens da BR-101, perto de uma área retomada no município de Itabela (BA). O Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas da Bahia (Mupoiba) caracterizou que eles foram “mais duas vítimas dos interesses dos latifundiários” e “da não demarcação de um território já reconhecido como tradicional e indígena”.
Em 4 de setembro do ano passado, Gustavo Silva da Conceição, um adolescente Pataxó de 14 anos foi morto com um tiro de fuzil na nuca durante o ataque de pistoleiros contra indígenas que haviam retomado uma fazendo dentro da TI Comexatibá Cahy Pequi, na cidade de Prado (BA).
Edição: Thalita Pires