Por Rayssa Motta
O parecer do Ministério Público Eleitoral (MPE) era uma das últimas pendências na ação sobre a reunião do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) com embaixadores estrangeiros.
O órgão defendeu a suspensão dos direitos políticos de Bolsonaro, o que na prática deixaria o ex-presidente inelegível por oito anos.
A ação de investigação eleitoral estará pronta para ser julgada no plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) assim que o ministro Benedito Gonçalves, relator do caso, apresentar seu voto e pedir a inclusão em pauta. A expectativa é que o julgamento seja realizado até o início de maio.
O processo vem correndo com celeridade, o que é comum na Justiça Eleitoral. O último levantamento Justiça em Números, uma espécie de raio-x do Judiciário organizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mostra que o tempo médio de tramitação dos processos na esfera eleitoral foi de três meses em 2020 e de dez meses em 2018 (ano eleitoral, quando a demanda é maior).
“As ações eleitorais têm mesmo essa característica de serem mais céleres. Tanto que é muito comum a gente ver a consequência da inelegibilidade ser resolvida antes dos reflexos criminais que algumas condutas podem ter. A Justiça Eleitoral é realmente mais célebre, os prazos são bem menores”, explica a advogada Maíra Recchia, presidente do Observatório Eleitoral da OAB de São Paulo.
A ação chegou ao Tribunal Superior Eleitoral em agosto do ano passado pelas mãos do PDT. O partido afirma que Bolsonaro usou o cargo e a estrutura do governo para espalhar notícias falsas sobre o processo eleitoral e para fazer campanha. A narrativa de fraude foi incorporada como uma de suas bandeiras na eleição.
O então presidente organizou uma apresentação para 70 diplomatas em julho do ano passado. Ele levantou suspeitas sobre a segurança das urnas e a higidez do sistema eletrônico de votação Bolsonaro chegou a dizer que o TSE teria admitido que hackers seriam capazes de alterar nomes de candidatos e votos.
A legislação eleitoral proíbe o uso da máquina pública e da estrutura do governo em benefício dos candidatos que buscam a reeleição. O abuso de poder político acontece justamente quando um candidato usa o cargo para tentar influenciar indevidamente a preferência dos eleitores.
Provas
O TSE encerrou a fase de colheita de provas no final de março. O tribunal buscou reconstituir a organização do evento na tentativa de entender como a estrutura do governo foi usada e quem se envolveu nos preparativos da reunião e no convite institucional disparado aos embaixadores.
Foram ouvidos o ex-ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, o almirante Flávio Augusto Viana Rocha, ex-secretário especial de Assuntos Estratégicos da Presidência, e o ex-chanceler Carlos Alberto França.
Outros episódios em que Bolsonaro atacou o sistema eleitoral foram incluídos no rol de provas da ação, o que pode ser usado para apontar uma conduta recorrente.
Outra prova juntada ao processo é a minuta golpista apreendida pela Polícia Federal na casa do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, que está preso na investigação sobre os atos de vandalismo na Praça dos Três Poderes. O rascunho previa uma intervenção no TSE, liderada por Bolsonaro com apoio do Ministério da Defesa, para anular o resultado da eleição.
A defesa do ex-presidente insistiu, sem sucesso, que o documento fosse excluído da ação. Os advogados afirmam que o texto é apócrifo e não pode servir como prova. O TSE negou os pedidos.
“Essa minuta pode entrar também no abuso do poder político se ficar provado que Bolsonaro usou os ministérios e sua prerrogativa de presidente para fabricar um golpe de estado, já com um decreto pronto no caso de derrota”, explica Maíra.
Alegações finais
A defesa de Bolsonaro enviou nesta semana suas alegações finais no processo. Um dos argumentos é que não há indícios que liguem o ex-presidente à minuta golpista. Os advogados também vinham afirmando que as declarações feitas por Bolsonaro na reunião com os embaixadores estão amparadas pelo direito à liberdade de expressão.
Após a defesa, foi a vez do vice-procurador-geral Eleitoral, Paulo Gustavo Gonet Branco, encaminhar seus argumentos. Ele entendeu que Bolsonaro abusou do poder político e deve ficar inelegível por oito anos.
As manifestações estão em sigilo.
Julgamento
Quando o processo for liberado para julgamento pelo relator, caberá ao ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE, incluir a ação na pauta.
O plenário do Tribunal Superior Eleitoral é composto por sete ministros – três vindos do Supremo Tribunal Federal (STF), dois do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e dois juristas.
Uma mudança recente na composição pode beneficiar o ex-presidente. Com a aposentadoria do ministro Ricardo Lewandowski, a vaga aberta no TSE ficou com Kassio Nunes Marques, indicado de Bolsonaro.