O ministro Luis Roberto Barroso assumiu nesta quinta-feira (28) a presidência do Supremo Tribunal Federal com a expectativa de trazer temas de direitos humanos e pautas ligadas à agenda progresista para a pauta da corte e implementar mudanças na forma de julgamento do tribunal.
Além disso, há expectativa grande no meio jurídico de mudança do perfil da corte, que estava sob o comando da ministra Rosa Weber, a mais discreta do tribunal, desde o ano passado. Diferente de Rosa, que é avessa a entrevistas e, por vezes, não externava suas posições nem mesmo para os integrantes de seu gabinete, Barroso se notabilizou por seu perfil midiático e disposto a participar de debates e eventos públicos de diferentes tipos com empresários e outras autoridades do Brasil e do exterior.
Em um dos mais recentes, em julho deste ano, ele chegou a afirmar que “nós derrotamos o bolsonarismo” durante a abertura do 59º Congresso da União Nacional dos Estudantes. A fala repercutiu mal em um momento em que estão para serem julgados pelo Supremo vários processos envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro, e o ministro chegou a telefonar para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para se desculpar e divulgou uma nota oficial depois se explicando.
Em outra ocasião, ele chegou a responder um manifestante bolsonarista que o abordou na rua em uma viagem para Nova York e disse “perdeu, mané, não amola” ao manifestante que o seguia.
Direitos sociais
Nascido no município de Vassouras (RJ) em 11 de março de 1958, Barroso já tinha uma carreira consolidada como um dos maiores advogados constitucionalistas do país quando foi indicado para a corte pela presidente Dilma Rousseff, em 2013. Ele é considerado uma das principais referências da principiologia constitucional no país, corrente do Direito que considera que alguns princípios podem ter um peso maior do que o que está escrito na lei e a expectativa.
Além disso, ele também é defensor de uma corrente que é favorável a uma maior participação dos atores sociais nos julgamentos de grandes causas da corte, por meio de audiências públicas e abertura de espaço para manifestações de amicus curiae (amigos da corte) se manifestarem em julgamentos de casos de grande repercussão.
Para a professora do programa de pós-graduação em Direito da UERJ e pós-doutora em Direito Constitucional, Vânia Aieta, Barroso deve trazer para a pauta do STF julgamentos ligados a temas de direitos sociais. “Vencido o Bolsonarismo, como ele mesmo deixou escapar, ele vai entrar nessa perspectiva principiológica para tentar impulsionar direitos sociais, como o próprio julgamento sobre direito ao aborto, e sobre casamento homoafetivo, por exemplo”, afirma a professora. Além de colega do ministro na UERJ, Vânia foi aluna dele no curso de Direito da faculdade, na década de 1980, e conhece bem o perfil liberal do hoje presidente do Supremo Tribunal Federal.
“O ministro Barroso é um democrata, um defensor genuíno da democracia liberal que defende uma proposta de sociedade inclusiva para os mais variados grupos políticos. O fato de ter posições mais arrojadas na pauta comportamental, sobretudo pela aplicação da principiologia constitucional na interpretação, acaba sendo visto, erroneamente, como um militante de partido de esquerda por certos grupos políticos”, explica Vânia.
Já o advogado e membro do coletivo Advogadas e Advogados pela Democracia, José Carlos Portella, vê em Barroso um defensor de uma perspectiva de abrir para a participação de diferentes atores sociais os julgamentos das chamadas Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental, um tipo de ação para evitar ou reparar prejuízos a direitos causados pelo poder público. “O ministro Barroso é da escola de professores do Rio de Janeiro que defendem essa perspectiva mais horizontal da interpretação da Constituição. Como o STF vai dar a última palavra, ele não pode errar”, explica Portella.
Foi com a orientação liberal e essa abordagem da principiologia que ele se notabilizou por defender temas tidos como polêmicos e progressistas desde sua atuação como advogado e procurador do Estado do Rio de Janeiro. Entre os julgamentos no STF que se destacou antes de virar ministro estão o que debateu a união homoafetiva, em 2011, e o uso de células-tronco para pesquisas científicas, em 2008.
Já enquanto ministro do Supremo, Barroso foi autor do voto vencedor do julgamento que levou à soltura de médicos e enfermeiros de uma clínica de aborto, em 2016. Na ocasião, o tribunal considerou por maioria que o aborto até o terceiro mês de gestação não configuraria crime.
Em 2019 o ministro barrou ainda uma lei municipal de Londrina que proibia debates sobre gênero nas escolas. Além disso, durante a pandemia de Covid-19 votou contra o direito de pais proibirem os filhos de se vacinar, determinou a suspensão de despejos, reintegrações de posse ou remoções e também determinou que o governo Bolsonaro adotasse uma série de medidas para proteger os povos indígenas diante da Covid-19.
Mudanças na corte
A expectativa é que a gestão do ministro também traga mudanças na forma de julgamentos da corte. Em busca de agilizar os julgamentos, o ministro tem discutido com seus pares algumas mudanças administrativas. Uma das hipóteses analisadas, segundo o jornal O Globo, seria uma alteração no rito do julgamento: em vez de onze votos individuais, com maioria formada a favor ou contra a tese em discussão, o relator e, se houver, o voto vogal, apresentariam os posicionamentos e seriam apenas acompanhados pelos colegas, como já acontece nos Estados Unidos, por exemplo.