Situação é desesperadora em diversas regiões, com perda nas lavouras, falta de água para consumo humano e animal
A realidade de pequenos agricultores familiares, camponeses e assentados da reforma agrária no Rio Grande do Sul voltou a ser desesperadora. Há 6 anos, eles vêm acumulando perdas e acessando cada vez menos iniciativas de seguridade ou mesmo de socorro da parte dos governos estadual e federal.
A imprensa dá destaque aos prejuízos milionários registrados pelo agronegócio em virtude da seca no Rio Grande do Sul. Municípios dependentes do agronegócio foram os primeiros a declarar situação de emergência. Poucos, porém, informam que normalmente a produção de comodities é coberta por mecanismos de seguridade que são acoplados aos financiamentos, em sua maior parte amparados por recursos públicos.
“A seca voltou aqui ao Rio Grande do Sul, estamos novamente enfrentando esse fenômeno que de tempos em tempos tem atingido o nosso estado”, afirma o dirigente da Via Campesina, Frei Sérgio Görgen. “Recebemos diariamente relatos de situação que ficou aflitiva para muita gente, com lavouras inviabilizadas, pastagens secas, perda do milho do cedo, propriedades sem água para dessedentar os animais, sem água sequer para o consumo humano”, comenta.
Na última quarta-feira (11) o dirigente recebeu relatos e imagens de assentados em Itacurubi, Santana do Livramento e Tupaciretã, bem como testemunhou a situação em territórios onde atua nos municípios de Hulha Negra, Candiota e Aceguá. “Precisamos nos mobilizar por ações de socorro e crédito emergencial para a agricultura camponesa e familiar, é hora de unir forças por nenhuma família sem água no RS, cobrando efetividade dos governos estadual e federal”, acrescentou.
Tupaciretã
Em Tupaciretã, Claudiomiro Cordeiro dos Santos, do assentamento Nova Tupã, explica que a situação está cada vez mais complicada. “O milho do cedo, que é utilizado para a silagem e deveria servir de alimento para os animais da bacia leiteira, foi todo perdido, a água dos açudes que servem para dessedentar os animais está secando, os poços artesianos estão com pouca vazão”, relata o camponês que participa da base do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e em âmbito local representa 700 famílias assentadas no Conselho de Desenvolvimento Rural.
“Além das perdas com a seca, temos um problema muito sério com o endividamento gerado nos últimos períodos em que aconteceram quebras da produção”, explicou. O município, cujo território tem presente tanto grupos do agronegócio quanto assentamentos da reforma agrária, foi um dos primeiros a declarar situação de emergência frente as consequências da estiagem. Renegociação das dívidas e crédito emergencial são dois pontos prioritários na avaliação de Claudiomiro.
Itacorubi
Juliana de Vargas, do assentamento Conquista da Luta, em Itacorubi, relembra que a respeito das ações emergenciais da seca de 2021/2022, há consenso de que foram insuficientes e chegaram tarde. “Foi mandado R$ 1 mil, que ajudou muito pouco e chegou muito tarde; a construção de cisternas que foi anunciada não chegou a acontecer e os micro açudes que foram abertos estão secos, pois não choveu o suficiente para encher.”
“O governador precisa organizar um plano bem elaborado e que realmente atenda os agricultores neste momento de grave crise hídrica no Rio Grande do Sul”, afirma. Alerta ainda que quando a agricultura camponesa e familiar sofre, a sociedade de forma geral é atingida, uma vez que o alimento que de fato chega até as mesas dos trabalhadores e trabalhadoras urbanos é produzido por essas pessoas. Também há reflexos na própria gestão pública, pois “com as perdas da agricultura os municípios também arrecadam menos e não conseguem honrar com seus compromissos”, finaliza.
Santana do Livramento
De Santana do Livramento, o relato de Paulo César Bosa, do assentamento Fidel Castro, ressalta a reincidência do fenômeno da seca, que já assolou a região na safra 2021/2022 e retornou com força e em grande proporção na safra 2022/2023.
“Nos meses de dezembro e janeiro não tivemos chuva em volume suficiente para armazenar água, os açudes e pequenos reservatórios estão secos ou barrentos, sem condições de garantir água para os animais, muitas famílias também já estão sem água potável e precisam ser atendidas por caminhões pipa”, explica. A respeito da produção, Bosa conta que o segmento de subsistência está severamente comprometido, atingindo itens como feijão, mandioca, batata, hortifrutigranjeiros, entre outros.
“Em muitos locais não vai produzir nada e onde a produção acontecer será muito pequena, quem não tem condições de irrigar está com tudo praticamente perdido”, explica. Na produção de grãos o milho está todo perdido, a quebra na produção de leite chega a 60%, quem plantou soja já está contabilizando uma perda de 30 a 40%.